DISCURSO DE ABERTURA

Ex.mo Sr. Engº Fernando Leite, digníssimo representante de Sua Excelência, o Sr. Director Regional
Ex.mo Sr. Presidente da Direcção Nacional da AEEP, Pe. Nuno Burguete,
Ex.mo Sr. Director Executivo do 5º Fórum do EPC, Prof. Doutor. Leandro Almeida,
Ex.mas Entidades Oficiais
Ex.mos Associados da AEEP,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,  

«Construir a escola do século XXI, Desafios e contributos do EPC», é o tema que aqui nos reúne neste 5º Fórum do EPC.

De que escola falamos nós? Que escola queremos nós?

Sem querer ser exaustivo, uma vez que os nossos ilustres conferencistas irão falar desta matéria, gostava de dar o pontapé de saída.

E gostaria de comparar a escola a uma árvore.

A todas as intempéries apenas conseguem sobreviver as árvores cujas raízes sejam robustas e estejam bem agarradas à terra. Estas raízes, do meu ponto de vista, são o Projecto Educativo. Se em cada uma das nossas escolas existir um bom projecto educativo, idealizado com princípio, meio e fim, de certeza que a escola, por mais alterações que tentem fazer em termos de políticas educativas, não sofrerá qualquer abalo de terra. 

No dizer dos Professores Fernando Diogo e Angelina Carvalho[1] «o projecto educativo deve servir a incerteza, ter em conta o indeterminado, ser capaz de inflectir de direcção como resultado de uma avaliação permanente, incorporar o conflito, mas, sobretudo, devolver a cada indivíduo o seu espaço de criatividade e acção de modo a que ele sinta reconhecida a sua actividade, compreenda as suas acções e as possa inscrever num todo significativo. Neste sentido, o projecto educativo deve ser colectivo mas favorecendo a interacção; autónomo mas não independente».

Da raiz surge o tronco. E quanto mais fortes são as raízes, mais forte será o tronco.

Este tronco, é, na continuação da minha metáfora, a própria organização escolar dos nossos estabelecimentos de ensino. O nosso modo de ser e de estar, em educação, deve ser uma mais valia para todo o sistema educativo nacional. O modo como as nossas escolas se organizam tem de ser modelo para o todo nacional. E todos nos recordámos, como no último Fórum, realizado no Algarve, a Senhora Secretária de Estado, Doutora Ana Benavente, referiu que o Estado procurava, no modo excelente como nos organizávamos, modelos para serem aplicados às escolas estatais. E vêmo-lo agora, de certa forma, plasmado no texto da Autonomia das Escolas e como, em muitas delas, ainda não existe vontade de crescimento nesta dimensão. A dependência do Estado a que as escolas estatais estão votadas, impede-as de poderem crescer e de serem verdadeiros espaços educativos.

Nós, pelo contrário, não queremos essa tutela do Estado e, nesse sentido, rejeitamos veementemente a tentativa que agora o Ministério pretende implementar e que diz respeito à avaliação integrada das escolas a levar a efeito pela Inspecção Geral da Educação. A ir por diante este modelo de avaliação das escolas estatais aplicado ao ensino privado, é retirar toda a possibilidade de nos organizarmos de acordo com os nossos projectos educativos e seguir esquemas que, se podem ser bons para as escolas estatais, para nós não o são.

Não rejeitamos a avaliação das nossas escolas, bem pelo contrário. Fomos nós que o pedimos ao Ministério através da cláusula 2ª do Pacto que assinámos com o Ministério da Educação. O que não queremos é este modelo. As nossas escolas dispõem de especificidades organizacionais que nos tornam diferentes das escolas estatais. E lembremos algumas: a titularidade, o modelo de direcção e gestão (que não depende hierarquicamente do Ministério da Educação), as margens mais amplas de autonomia, em termos de contratação de professores, de gestão de recursos humanos, de infra-estruturas, e de gestão financeira), para já não falar de muitos outros aspectos em que somos perfeitamente pioneiros.

O Professor Doutor Carlos Alberto Estêvão, primeiro orador deste 5º Fórum, muito tem trabalhado nesta matéria da organização escolar dos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo. E gostaria aqui de recordar o que ele nos diz a páginas 306, da sua tese de doutoramento[2]: «as escolas privadas são insistentemente realçadas por suscitarem uma orientação mais próxima de um sistema doméstico, por incutirem um ethos mais familiar, por desenvolverem um “cerimonial de envolvimento” de alunos e pais mais activo. As realizações festivas e as iniciativas culturais com convites à participação de toda a comunidade, as acções de formação orientadas para os encarregados de educação, a distribuição de ideários e de outros documentos sinalizadores do compromisso dos pais para com o projecto da escola, e outras múltiplas actividades, fazem da escola privada uma organização única».

 Mas porque todos somos diferentes, ou seja, porque cada escola, tem uma liderança e uma visão organizacional diferente, a riqueza do ensino privado em termos organizacionais, está, como tão bem diz o nosso Presidente da Direcção Nacional, Pe. Nuno Burguete, na diversidade.

 Precisamos, por isso, de cuidar bem deste tronco, para que dele possa surgir uma árvore frondosa e robusta onde cada ranca representa cada um dos intérpretes do todo que está significado no Projecto Educativo: os professores, os pais, os alunos e todos aqueles funcionários que colaboram com as direcções das escolas, ou seja, cada ranca é constituída por aqueles que apostam no Projecto Educativo e que comungam de todos os ideais da escola. 

A relação pessoal e interpessoal, que se estabelecer entre todos estes intervenientes na acção educativa, irá tornar a escola atractiva e a ela todos quererão acorrer por aí encontrarem um lugar ideal para a formação do seu carácter e da sua personalidade. 

Como antes dizia, uma das rancas desta árvore são os Professores. Teremos oportunidade de ouvir falar desta matéria através do Professor Saul Neves, que nos últimos tempos, tem dedicado parte da sua investigação a esta temática. 

Mas, porque acho interessante, gostaria de utilizar o pensamento do Professor António Nóvoa[3] que afirma que o processo identitário dos professores é sustentado, por aquilo a que ele chama «Os três AAA»: 

«A de Adesão, porque ser professor implica a adesão a princípios e a valores, a adopção de projectos, um investimento positivo nas potencialidades das crianças e dos jovens. 

A de Acção, porque também aqui, na escolha das melhores maneiras de agir, se jogam decisões do foro profissional e do foro pessoal. Todos sabemos que certas técnicas e métodos “colam” melhor com a nossa maneira de ser do que outros. Todos sabemos que o sucesso ou insucesso de certas experiências “marcam” a nossa postura pedagógica, fazendo-nos sentir bem ou mal com esta ou aquela maneira de trabalhar na sala de aula. 

A de autoconsciência, porque em última análise tudo se decide no processo de reflexão que o professor leva  a cabo sobre a sua própria acção. É uma dimensão decisiva da profissão docente, na medida em que a mudança e a inovação pedagógica estão intimamente dependentes deste pensamento reflexivo». 

De acordo com o projecto educativo de cada escola, todos temos a possibilidade de ir criando, a pouco e pouco, um corpo docente, que viva a escola de forma diferente, que viva a escola como a sua segunda casa e onde dá gosto investir e trabalhar. 

E, por último, gostaria de dizer que todo o nosso labor e dedicação, tem uma finalidade: os alunos. E também aqui, nós precisamos de ser diferentes. Diz o Professor Joaquim Azevedo que[4] «uma instituição escolar vocacionada para os alunos é uma organização preocupada com a transmissão dos conteúdos programáticos, com o cumprimento das normas administrativas, com a certificação dos conhecimentos adquiridos, com a submissão da diversidade ao comportamento da média». Não é isto o que nós queremos ser, mas sim uma instituição escolar direccionada para as pessoas que moram nos alunos. E continua o Professor Joaquim Azevedo a dizer-nos: «esta será uma organização atenta às potencialidades de cada aluno, capaz de verificar as condições de cada um para obter os resultados esperados, pronta a apoiar cada um para que possa progredir como aluno nas aprendizagens escolares, impulsionadora da participação escolar das crianças e dos jovens, preocupada em criar novas oportunidades para a sua formação e para que possam crescer segundo orientações diversas». 

Todos temos perfeita consciência de que, ainda, muito há por fazer. Essa é a razão por que nos deslocamos até aqui para participar e debater ideias que nos permitirão intra muros fazer uma reflexão muito mais cuidada no sentido de todos fortalecermos as nossas escolas a fim de que eles sejam verdadeiros espaços educativos e de crescimento. 

            A Delegação Regional Norte da Associação dos Estabelecimentos do Ensino Particular e Cooperativo, a quem coube, por mandato da Direcção Nacional, organizar este Fórum, contou com a prestigiosa colaboração do Professor Doutor Leandro Almeida que aceitou o desafio de coordenar este Fórum, no sentido de lhe dar a unidade tão necessária a eventos desta natureza. 

            E termino, dando-vos as boas vindas e esperando que destes dois dias de trabalho, possam sair conclusões importantes para melhorarmos a qualidade das nossas escolas no sentido de que a folhagem e a foração, que elas simbolizam, possam ser sempre verdejantes e viçosas, sinal de que estamos no caminho certo e de que podemos continuar a ser a aposta certa para o ensino em Portugal.

 Muito obrigado.



[1] CARVALHO, Angelina e DIOGO, Fernando, Projecto Educativo, Col. Polígono, Ed. Afrontamento, 1994, pg. 45

[2] ESTÊVÃO, CARLOS ALBERTO VILAR, Redescobrir a Escola Privada Portuguesa como Organização, Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho, 1998, pg. 306-7.

[3] NÓVOA, ANTÓNIO, Os Professores e as Histórias da sua Vida, in VIDAS DE PROFESSORES, Colecção Ciências da Educação, Porto Editora, 1995, 2ª ed., pg. 16.

[4] AZEVEDO, JOAQUIM, Avenidas da Liberdade, Reflexões sobre Política Educativa, Ed. Asa, 1994, pg. 129.

Pe. Manuel Rocha
Delegado Regional Norte da AEEP