“Auschwizt Sempre” II - O Poder da escola

Os alunos da via científica do 12.º AJD e a Prof.ª Maria José Queirós
03/01/2019

O lançamento do projeto “Auschwizt Sempre” resultou da profunda convicção de que à escola cabe a tremenda responsabilidade de educar para o respeito, a tolerância ativa e o amor ao outro, facilitado quando nos colocamos no lugar deste.

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No ensino das ciências sociais e humanas, deparamo-nos, com demasiada frequência, com a necessidade de referirmos que a história se repete, nas causas e consequências dos acontecimentos que marcaram o mundo nos últimos cem anos.

Com efeito, as ondas de populismos e nacionalismos exacerbados de que atualmente damos conta, e que estão na base das principais ameaças à paz e segurança mundiais, radicam-se nos mesmos fundamentos/fundamentalismos e exploram os mesmos princípios defendidos por Adolf Hitler.

70 anos depois, a humanidade continua à procura de bodes expiatórios, emigrantes, e refugiados a quem se atribui os níveis de desemprego ou os ataques terroristas como se de uma questão de pele, cor ou religião se tratasse.

Percebendo a importância e o poder da escola enquanto espaço transformador de “crianças em bons nazis” (BARTOLETTI), tornou-se essencial, tanto para os alunos quanto para os professores, professar a fé que tinham no sistema racista apresentado por Hitler, auxiliando na luta pela nova Alemanha que deveria ser pura e sem os inimigos da raça ariana.

«Eu busco uma juventude profundamente ativa, dominadora, brutal, a juventude deve ser indiferente à dor. Não pode ter fraqueza, nem carinho.»
Adolf Hitler

Para que o efeito pretendido ocorresse, foram muitas as alterações produzidas no sistema de ensino.


Educação Física:

Para Hitler, a Educação Física representava a mais importante matéria a ser desenvolvida na escola, na medida em que defendia que a educação deveria visar o aperfeiçoamento físico do indivíduo. Devido a isso, as aulas de Educação Física passaram a representar uma das matérias mais importantes. A principal intenção do Estado deveria ser a formação de jovens saudáveis fisicamente, com um caráter fortalecido (conforme os padrões nazis) e que, com isso, pudessem dar ao mundo novos seres tão qualificados quanto eles através da procriação.

«Tendo isso em vista, o Estado deve dirigir a educação do povo, não no sentido puramente intelectual, mas visando sobretudo à formação de corpos sadios. Em segundo plano, é que vem a educação intelectual. Aqui, ainda, a formação do caráter deve ser a primeira preocupação, especialmente a formação do poder de vontade e de decisão e o hábito de assumir com prazer todas as responsabilidades. Essa confiança deve ser cultivada na juventude, desde a meninice. Toda a sua educação, todo o seu treinamento, devem ser dirigidos no sentido de dar-lhe a convicção da sua superioridade. Certa da sua força e da sua habilidade, a mocidade deve readquirir a fé na invencibilidade da sua nação.»
Adolf Hitler

 

História e Geografia:

Estudar a história serviria não para entender o passado, mas para orientar o futuro da nação alemã. A intenção era reformular a história do mundo tornando a questão racial o ponto dominante nos acontecimentos. Tornou-se imprescindível ensinar apenas sobre figuras germânicas puras, deixando de lado todos os outros que não fossem alemães de sangue puro, além do que deveria sempre mencionar-se Hitler como o salvador da Alemanha.

«O Estado nacionalista deve ver na ciência um meio de aumentar o orgulho nacional. Tanto a história universal quanto a história da civilização devem ser ensinadas sob esse aspeto. Um inventor deve ser visto não só porque é inventor, mas também porque é um dos nossos compatriotas. A admiração por todas as grandes ações deve ser combinada ao orgulho por ser o seu executor um membro da nossa pátria. Devemos selecionar as maiores figuras da massa dos grandes nomes da nossa história e pô-las diante da juventude de modo tão impressionante que elas possam servir de colunas mestras de um inabalável sentimento nacionalista.»

Também nas aulas de Geografia, os professores preparavam o espírito dos alunos baseando-se nas teorias sobre a raça juntamente com a geopolítica, a fim de abrir espaço para os ideais de expansão política ambicionados por Hitler.

«Inúmeros livros didáticos de geografia propagaram conceitos como espaço vital e sangue e solo, e difundiram o mito da superioridade racial alemã. Os mapas mundiais e os novos livros didáticos enfatizaram a importância da geopolítica, corroboraram implicitamente o conceito de 'um povo, um “Reich”', ou traçaram a expansão das tribos germânicas através da Europa do Leste e central na Idade Média.»

 

Língua materna:

Os professores estavam proibidos de recorrer às obras clássicas vendo- se obrigados a escolher textos que ilustrassem os laços que ligavam a comunidade na sua luta, presentes muitas vezes em escritos por nacionais- socialistas que traziam histórias que enalteciam Hitler e apresentavam os judeus.

«Sempre com aspeto “diabólico”, escondidos em locais escuros, aguardando para fazer mal a uma criança alemã. Esse tipo de material era utilizado em sala de aula para o trabalho de leitura e interpretação dos alunos na escola primária.»

 

Biologia:

As aulas de Biologia eram o espaço privilegiado para demonstrar e anunciar a importância dos conhecimentos étnicos para a futura projeção do “Reich”, pelo que as crianças eram exaustivamente ensinadas sobre o valor da genética e a importância da origem de seus antepassados.

«A biologia foi transformada para incluir as leis da hereditariedade, ensinamento racial, higiene racial, ensinamento sobre a família e política populacional.»
(Evans 2011)

 

Ciências Raciais e Eugenia:

Foram acrescentadas ao currículo escolar para que os alunos treinassem o reconhecimento de outras “raças”, pelo que

«Os alunos deveriam aprender a reconhecer a raça de alguém através da observação, para isso, analisavam personagens de poemas, novelas ou romances, retirando desses as conclusões sobre a raça e relacionando com os traços físicos que apresentavam. Posteriormente, o aluno era instruído a aplicar essa tarefa ao seu círculo pessoal, a fim de conseguir reconhecer os traços e comportamentos principalmente dos judeus. Visando exercitar o olhar da criança para julgar rostos estrangeiros, acrescentavam-se as sessões mais práticas ainda de mensuração da caixa craniana a que se entregavam mutuamente os alunos, nas salas de aula. Tratava-se de ora aprender a descrever a expressão frouxa e dissimulada de seus camaradas judeus, ora de aprender a reconhecer os mais belos espécimes da raça nórdica ou ariana.»
Michaud (1996)

 

Física e Matemática:

Apesar de parecerem imparciais, até mesmo as disciplinas de física e matemática foram submetidas a reformulações para auxiliar no fortalecimento do sentimento de raça. Reorientou-se a matéria da Física para incluir nos seus conteúdos programáticos tópicos militares, tais como balística, aerodinâmica e radiocomunicação.

O ensino da matemática passou a utilizar conceitos que reforçassem a ideologia desejada.

«Uma pessoa mentalmente incapaz custa 4 “Reichsmark” por dia, um aleijado custa 5,5 “Reichsmark” por dia e um criminoso condenado, 3,5 “Reichsmark”. As estimativas cautelosas dizem que, dentro das fronteiras do “Reich” alemão, 300.000 pessoas estão recebendo cuidados em instituições públicas. Quantos empréstimos matrimoniais de 1000 “Reichsmark” por casal poderiam ser concedidos anualmente, usando-se os fundos destinados a tais instituições?»
Exemplo de um exercício Koch (1973)

 

As atividades extracurriculares:

Tornaram-se também obrigatórias para as crianças e jovens alemães objetivando envolvê-los ainda mais profundamente nos projetos da nova Alemanha ambicionada por Hitler. Sendo assim, a juventude estava envolta por uma doutrinação constante que os direcionava na forma de pensar e agir. A principal Organização responsável por essas atividades extras é denominada Juventude Hitleriana (JH).

O Partido Nazi prometeu aos jovens alemães algo diferente do que estavam presenciando até ao momento. Assim, ao ingressarem na organização, esses jovens teriam um grande futuro numa grande Alemanha, longe do desemprego, humilhação e insegurança vividos pelos seus pais na sequência da derrota alemã da 1.ª Grande Guerra.

«A Juventude Hitleriana oferecia a seus integrantes agitação, aventura e novos heróis para venerar. Deu a estes jovens esperança, poder e a oportunidade de fazer serem ouvidas as suas vozes. Para alguns, deu também a oportunidade de se rebelarem contra os pais, professores, padres e outros superiores.»
Bartoletti (2006)

Mesmo após a rendição da Alemanha, em 1945, levaria ainda muitos anos para que os integrantes da JH assimilassem a verdade sobre o partido nazi, e principalmente sobre a sua participação no grande número de assassinatos em massa ocorridos durante o governo do Terceiro “Reich”.

Inicialmente, muitos membros da JH não acreditaram no que os Aliados contavam sobre o nazismo e achavam que as imagens, filmes e relatos que eram obrigados a assistir haviam sido montados pelos Aliados para difamar os nazis.

Levou algum tempo para que muitos desses jovens superassem a doutrinação nazi e percebessem as consequências de seus atos.

A escola recuperou o seu papel e os professores foram incentivados a promover a visão independente e o pensamento crítico sobre todos os assuntos, ensinando os alunos a respeitar os valores da liberdade e de democracia ancorados no respeito pelo outro.

Sete décadas depois, será preciso reviver todo o processo ou bastará começar pelo fim educando, todos os dias e em todas as aulas, para a cidadania.


Por isso, “Auschwitz Sempre” (para não esquecer)!

 

Os alunos da via científica do 12.º AJD e a Prof.ª Maria José Queirós

 

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